Universidade Federal de Pelotas
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CADASTRO DE PROJETO DE PESQUISA
 Dados do Projeto
Código: 8.02.10.025
Título do Projeto
Literatura de cárcere: o testemunho histórico-político e a escrita de si
Data de cadastro
21/06/2011
Unidade
Departamento
Objetivos
Geral: Analisar as condições teóricas, discursivas, históricas e ideológicas em torno da literatura do cárcere. Específicos: Estudar, a partir das categorias pertinentes à literatura de cárcere (notadamente testemunho e escrita de si), textos, literários ou não literários (tais como diários, cartas, depoimentos), produzidos no Brasil, bem como verificar as relações intertextuais estabelecidas entre os textos pertencentes a uma “tradição” da literatura de cárcere; verificar uma possível mudança de paradigma da literatura de cárcere a partir da evidência da mudança do sujeito enunciador “preso político” para “preso comum”.
Subárea de conhecimento
8.02.10.00-7 (CNPq)
Grupo de Pesquisa do Coordenador
Estudos Comparados de Literatura, Cultura e História
Prazo de execução
42 meses
Início
01/07/2011
Término
31/12/2014
Fonte financiadora
Valor liberado
R$ 0,00
Coordenador do Projeto
SIAPE Nome E-mail HS
1077011 Aulus Mandagara Martins aulus.mm@gmail.com 06
Envolve experimentação com modelos animais? NÃO - Registro no CEEA:
Envolve experimentos utilizando vírus, microorganismos patogênicos, ou organismos geneticamente modificados? NÃO
Possui Certificado de Qualidade em Biossegurança ou em processo de qualificação? NÃO



Resumo:

A Literatura de Cárcere (textos fictícios, memórias, diários, cartas, depoimentos, relatos de uma experiência carcerária ou de confinamento) remonta a uma longa tradição literária ou, para usar um termo mais amplo e flexível, discursiva, que, em suas mais diversas manifestações textuais, articula a pertinência de um testemunho histórico ou político a uma prática da escrita de si. Esse entrelaçamento de uma experiência factual inserida na história com a confissão, a autobiografia ou a autoficção parece ser o elemento que assegura uma marca genérica a textos tão díspares quanto, por exemplo, Memórias da casa dos mortos de Dostoiévski, Os afogados e os sobreviventes de Primo Levi, As memórias do cárcere de Graciliano Ramos ou o conto “Estória do ladrão e do papagaio” de Luandino Vieira. Escritos a partir da experiência factual de encarceramento dos autores, os textos citados constituem-se em testemunhos que denunciam as práticas e discursos acerca do sistema carcerário de estados autoritários ou de exceção, mas também assumem um tom mais intimista, confessional e autobiográfico, através da narrativa do cotidiano e das angústias de um “eu” encarcerado, sejam elas explicitamente autobiográficas, sejam elas elaborações ficcionais daquela experiência. Desse modo, política, história, memória e confissão configuram um gênero que oscila constantemente entre uma “esfera política” (as circunstâncias históricas e políticas que levaram o sujeito à prisão) e uma “esfera privada” (a gama de sentimentos e experiências decorrentes da privação da liberdade). Os exemplos citados servem ainda para definir um paradigma da literatura de cárcere em relação ao sujeito encarcerado: o preso político, com formação intelectual (geralmente um indivíduo que já se apresentava como escritor) e dotado de consciência política e história, aspectos que garantem ao texto tanto sua relevância como testemunho quanto seu reconhecimento como literário (quando se trata de uma narrativa de ficção) ou pelo menos pertencente à “cultura letrada”. No entanto, esse paradigma (pelo menos na cena brasileira) parece estar em crise e uma “nova” literatura de cárcere solicita uma investigação mais acurada. Inúmeros textos publicados a partir do início desta década assinalam a emergência de “novos escritos do cárcere”. De fato, obras como Memórias de um sobrevivente (2001) de Luiz Alberto Mendes, Diário de um detento: o livro (2001) de Jocenir ou ainda Sobrevivente André du Rap (do Massacre do Carandiru) (2002), depoimento de André du Rap ao jornalista Bruno Zeni atestariam o surgimento de uma “nova” literatura de cárcere. Nesses textos, a principal ruptura com o modelo anterior é a substituição da figura do preso político pelo preso comum. Nesses “novos escritos do cárcere” certamente ainda é possível observar a pertinência do testemunho e a prática da escrita de si. No entanto, cabe perguntar de que forma as “esferas” política e privada se articulam, e de que modo as noções de testemunho e escrita de si devem ser pensadas. Por hipótese, nesses textos a dimensão do testemunho deslocar-se-ia do cenário político e histórico (que penalizava o sujeito a partir de uma perspectiva ideológica) para o cenário da situação carcerária (que encarcera o sujeito a partir de uma perspectiva judicial, mas da qual o elemento político e histórico não se ausenta). Por outro lado, esses textos são escritos por narradores talvez não plenamente legitimados de um ponto de vista literário mais restrito, como observamos sobretudo no exemplo do relato de André Du Rap, cujo depoimento foi narrado por um jornalista. Desse modo, essa nova literatura do cárcere, no exemplo citado e também ou outras obras como Estação Carandiru de Dráuzio Varela, retoma as estratégias textuais do testimonio latino-americano, em que o relato da testemunha factual é mediado por um “narrador profissional”.